segunda-feira, 14 de setembro de 2009

51 reais

Tudo tem um limite. O corpo humano tem um também. Depois de sair, dançar e beber a noite inteira, um café bebido, por volta das 7 da matina e rumo a uma saída de campo da faculdade. O ônibus saía as 9 horas e a professora exigia pontualidade. Embarca, senta, viaja, levanta, desce, visita, embarca, senta, viaja, desce, visita... Um passeio sem fim para quem não havia dormido na noite anterior.
A tardinha, exausto, chega ao ponto de partida. Vai pra casa, toma um banho, coloca o terno. Olha no espelho e pensa:
- Puta merda! To acabado! Não devia ter saído. Muito menos bebido.
Faz a barba pra melhorar o visual. Pouco consegue.
Segue atrasado pra formatura. Lembra que não comprou presente. Passa na rodoviária, vai ao caixa automático e saca cinqüenta e um reais. Ainda existia nota de um real na época. Cinqüenta pro presente e um real pro pedinte que irá “cuidar” o carro durante a noite. Dirige em direção a uma floricultura qualquer. Lembra que na avenida principal sempre ficam abertas até mais tarde para o atendimento dos atrasados, esquecidos e desorganizados como ele. Compra flores propícias pra ocasião, segundo a vendedora.
Procura uma vaga entre o auditório e o local onde a formanda recepcionaria os convidados. Assim economizaria tempo e usaria o real sacado. Demora a encontrar uma vaga, por fim estaciona o auto. Perde muito tempo. Auditório pequeno, chega atrasado, e assiste em pé e pelo telão a colação de grau. Encontra um casal de amigos e aguarda do lado de fora do auditório a hora de cumprimentar a nova arquiteta.
- Parabéns! Te desejo muito sucesso! - era o que sempre dizia nessas ocasiões.
Acompanha o casal a pé até o local da recepção. Pede uma cerveja na tentativa de enganar o cansaço. Espera os salgadinhos bebendo cerveja. Faz calor, muito calor! Mais bebe do que come. A certa altura repara que só há casais na festa. Exceto uma conhecida, amiga da família, que também acompanhava um casal. Dois avulsos na festa. Bebe mais um pouco pra se aproximar, ensaia a frase, pede licença ao casal de amigos e vai em direção a única solteira da festa.
- Olá, boa noite! - cumprimenta a todos na mesa - Já reparou que nós somos os únicos solteiros da festa? - pergunta à moça.
Ela olha em volta e diz, surpresa:
- É verdade! Não tinha percebido.
- Se quiser sentar conosco, estamos naquela mesa. - aponta com o indicador.
- Ok. Pode deixar! - desdenha a moça.
Por volta das 22 horas, com a formanda já presente no ambiente, a moça junta-se ao exausto rapaz e ao casal, já devidamente apresentados.
- Mais uma cerveja! E mais um copo! - pede a donzela, nem tão donzela assim.
Próximo da meia noite, cessa a música ambiente, dando lugar a música ao vivo. Um conjunto que tocava todos os tipos de músicas, daqueles que agradam dos avós da formanda, até os bebês de colo. O casal de namorados e o casal de solteiros aproximam-se do palco e dançam. Entre uma cerveja e outra o casal de solteiros beijam-se e passam a ser o único casal de ficastes da festa. Até as 3 horas e pouco, o guerreiro disfarça os bocejos e o cansaço. Quando não consegue mais, usa um argumento bastante plausível para ir embora:
- Tu não queres ir pra minha casa?
- Tá louco! E tua mãe! - retruca.
- Não ta em casa. Foi em uma formatura em outra cidade. Vamos? - insiste.
- Mais uma cerveja! - pede a moça ao garçom. - Vamos tomar a saidera, então! Ok?
- Claro...
Negócio fechado! Já sabia do interesse da moça quando freqüentava a sua casa. Era questão de oportunidade. O problema é que, as vezes, as oportunidades aparecem em momentos pouco apropriados. Enquanto a moça bebia e dançava de forma inquietante, o rapaz mantinha-se em pé, e mais: esforçava-se em permanecer acordado. O outro casal já tinha ido embora. Casais de namorados geralmente saem mais cedo das festas do que os solteiros. Meia hora depois, despedem-se da formanda, não menos cansada, e de sua família e procuram o carro estacionado nas cercanias.
A caminho de casa, a moça deixa claroque não estavam a caminho de casa para dormir de conchinha:
- Tu tens camisinha?
- Não! Precisa? - pergunta, mas não perde tempo aguardando a resposta. - Vamos passar na farmácia pra comprar.
Chega em casa próximo das 4 horas. Nesta altura, já duvidava do seu desempenho sexual, tal qual o cansaço que sentia. Bem diferente da moça, que dançou boa parte da noite com os pés descalços e parecia, naquela hora, muito desperta. Contudo, não passa pela cabeça a possibilidade de desistir. Não sem tentar. E ela valia o esforço. Bonita, inteligente, cheirosa, dançava bem e beijava bem. Teoriza que se ela dança bem e beija bem tem que trepar melhor ainda.
Coloca a camisinha e surpreende-se consigo. Deve ser por causa do futebolzinho que tem jogado nesse verão. Sente-se bem, em forma, mesmo com a barriguinha de chope. Como era de se esperar, goza e apaga nos braços da nova amada.
Acorda com uma bela chupada. Impressionante a capacidade que nós homens temos de ter ereção mesmo dormindo. Por baixo, transa pela segunda vez com a moça, que, diferente dele, deve ter dormido na noite anterior. Dessa vez, sem camisinha. Apenas esforça-se em manter a ereção. Tinha razão. Ela era muito boa.
- Cinqüenta e um reais!! - grita ele, acordando a si mesmo e interrompendo o vai e vem da moça.
- Cinqüenta e um reais? - indaga surpresa.
- O quê?!?! - indaga ele, já acordado - Do que tu ta falando?
- Tu falou isso: cinqüenta e um reais! - responde.
- Eu?!?! Capaz... Continua aí... Não para não...
Ela continua. Ele consegue evitar o sono até gozarem juntos, e os dois dormem até umas 7 horas.
- Psiu!! Acorda!!! Tenho que ir pra casa! Acorda! - diz ela o sacudindo.
- Dorme aí! Almoça aí! - responde virando pro lado.
- Acorda! Minha mãe me mata se souber que dormi fora de casa. Me leva lá ou chama um táxi! - impõe.
- Que táxi! Não tem táxi por aqui a essa hora. Deixa que eu te levo. - assim define, ao abrir os olhos.
Levanta. Escova os dentes. Tinha um gosto de tampa de cerveja no paladar. Vai a cozinha, pega uma água. Talvez precisasse hidratar o organismo com uma piscina e não com uma mera garrafinha de água mineral. Antes de sair, percebe que o molho de chaves da sua mãe está sobre a estante. Abre a porta e o portão e saí.
Com muita dificuldade de manter os olhos abertos devido ao sono, ao cansaço e ao álcool, deixa a cinderela em casa, só que bem depois da meia noite. Ela sai do carro, ajeita o vestido e procura a chave numa bolsa minúscula, onde talvez só coubesse a própria chave. Observa as panturrilhas torneadas, a pele branca. Segue o contorno do vestido verde, a cintura fina. Os braços macios que acabara de tocar, o cabelo comprido e castanhos que ficavam entre a cintura e os ombros... Achou a chave! Abriu o portão, olhou discretamente e abanou com mais discrição ainda.
Do retorno pra casa, pouco lembra. Entre um gole e outro da água colhida na torneira, quase bateu o carro no mínimo três vezes, no cordão da calçada. Mesmo com os vidros abaixados não controlava o sono. Molha a mão esquerda e umedece o rosto e o pescoço. Chega em casa e apaga sobre a cama que ainda cheirava a sexo.
- Meu filho! Acorda! Come alguma coisa e depois tu voltas a dormir. Já são 5 horas da tarde. - avisa a mãe.
Por volta das 18 horas vai até a cozinha e almoça. Ou janta? A fome só não era maior do que a sede.
- Meu filho, tu tens que tomar mais cuidado. Cheguei em casa umas 5 horas da manhã e a casa tava toda aberta. O carro na rua aberto. O cachorro na rua, solto.
Lembra que havia deixado a porta do quarto escancarada. E que a moça era conhecida da família. Não importa. A maior preocupação era a reputação abalada, após uma cochilada durante o sexo.
- Alô! Oi. Sou eu. Não te assusta. Não engravidei. - ri ela do outro da linha. - Só liguei pra te dar um ‘oi’.
Imagina se ela engravida. Já ouvi muitas coisas, mas nunca vi engravidar uma mulher dormindo.

2 comentários:

  1. 51 REAIS!!! Quase tive um troço dando risada, imaginando a cena! hahaha Jaison, gostei do blog... várias histórias eu já conheço mas, contadas aqui, tem um charme a mais!! Notei que tem contos que tu mistura a 3ª e a 1ª pessoa... não sei se é de propósito ou tais te entregando! hahaha Beijão! Já sou tua seguidora... os outros acho q desistiram!

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  2. Estou às lágrimas de tanto rir, pobre Roger, é um guerreiro!! Adorei a narrativa, diversão garantida!

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